domingo, 4 de agosto de 2013

Mudos ou envergonhados?

Navio negreiro, Rugendas

Anteriormente reclamei do pouco enfoque às últimas notícias sobre a boutique flagrada ao utilizar trabalhadores em condição análoga a de escravo, não só pela mídia, mas pela maioria das pessoas do meu convívio social. Chocante ver que, realmente, as notícias sobre a boutique quebrada no Leblon, a que foi quebrada por ter cometido a mesma conduta que descrevi no início do parágrafo foi muito mais repetida na minha timeline e na mídia do que esse escândalo. Fora algumas poucas pessoas que considero verdadeiros portos de lucidez, ninguém divulgou a vergonha do nosso consumismo.

Nos comovemos com as lágrimas do empresário, mas não ficamos tão comovidos e tampouco revoltados com as pessoas pobres que foram submetidas a um tratamento degradante. Pessoas humildes atreladas à uma quantidade extenuante de trabalho por dívidas não nos choca e isso não aconteceu no meio do mato, nos longínquos sertões do Brasil. Foi dentro de uma das nossas jóias do capitalismo, nossas megalópoles ensandecidas. Em nossos mercados da agonia, mercantilizamos dessa vez a dignidade humana e o direito fundamental ao trabalho, o direito básico de se manter por seus próprios esforços. Aquilo que deveria ser mais prezado pelos capitalistas é rapidamente esquecido quando se torna instrumento da opressão.

Realmente, os "vândalos" do Black Block, de alguns perfis Anonymous e outras páginas a favor das manifestações têm toda razão ao organizar o evento virtual para a missa de 7º  dia em homenagem aos Manequins da Boutique. É um cinismo de revirar as tripas.

Não bastasse a cobertura discreta da grande mídia, dessa vez, não vi gifs. com mensagens gritantes ou os conservadores pedindo para que alguém fosse preso o resto da vida por isso. Não vi o chamado por CADEIA. Não houve caça às bruxas, ninguém pediu medidas mais pesadas, ninguém quis fazer a menor questão de saber se os responsáveis seriam punidos. Não houve o sentimento vingativo de ver aquelas pessoas presas e endividadas. Agredir a dignidade do proletário aqui é tão comum que as pessoas não se chocam, não se importam, esquecem e depois voltam a comprar nos mesmos lugares.

 - Pelo menos não estão passando fome...

O blog do Sakamoto descreveu com precisão as condições degradantes a que as pessoas foram submetidas. E o mais impressionante é que isso já foi noticiado antes e como das outras vezes não demos tanta importância.* 

Estamos nos tornando o espelho mais feio da política imperialista. Agora, além de vender bombas de efeito moral e de gás pro mundo inteiro, submetemos pessoas esfomeadas de países vizinhos a um regime de trabalho escravizante. A meritocracia para esses não serve, ela é para os letrados, aqueles que manufaturam os objetos de desejo em nossas vitrines não podem fazer parte dela.

Continuarmos nesse caminho teremos bolivianos entregando pizzas, equatorianos lavando o chão e guatemaltecos fritando bolinhos. Todos ilegais. Criaremos uma nova denominação para esses, em vez de "paraíbas" teremos os "ticanos". Os ufanistas vão ficar orgulhosos. Finalmente verão o Gigante dominar o mundo e se os serviçais vierem dos "comunistas" da América do Sul melhor. 

A escravização do consumismo rompeu as barreiras dos crediários para levar seu grilhão às pessoas humildes, literalmente. 

 - Tudo bem. Eles admitiram o seu erro, assinaram um termo de ajustamento de conduta e eles estão limpos. Podemos voltar a comprar deles. Prisão perpétua pros corruptos! Pena de morte pra vagabundo!

Ao contrário do que acontece com as condutas antissociais normalmente praticadas por pessoa de baixa renda, não há estigma. Não se criou o rótulo para os escravagistas, não se fala dessa gente como se fala da "vagabundagem". O sistema simplesmente torna aquilo um caso isolado, a ganância extrema em vender o objeto por 150 vezes o valor que dá para o artesão não é vista como um problema tão sério, mas é essa mesma ganância que paga os corruptos, que forma os cartéis e que atrasa o País. E os inocentes úteis, empurrados pela Mídia vampira, vão continuar a olhar apenas para os corruptos. Escolhem seus alvos de acordo com esterótipos criados por quem controla a sua mira.

Para os poucos que ousam refletir sobre isso, esse absurdo é constrangedor. Por isso não há revolta, indignação ou tanto ativismo virtual. Preferimos esquecer, ficamos mudos de vergonha.


http://reporterbrasil.org.br/2011/08/roupas-da-zara-sao-fabricadas-com-mao-de-obra-escrava/

Veja o problema ilustrado
Foto: Pragmatismo Político
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Dados alarmantes em um ótimo texto do Grupo História e Política no Facebook: http://www.facebook.com/#!/groups/443691389048031/


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