quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Traição no tabuleiro de coxinhas - Mensalão

Claus Roxin, criador da Teoria do Domínio do Fato, em entrevista à Folha, repudia a forma pela qual foi utilizada pelo STF, fonte: Pragmatismo Político


Peço perdão ao leitor por exumar um assunto já esquecido pela rapidez cibernética, mas há muito que queria reclamar aqui sobre isso.

O julgamento do Mensalão foi um exemplo de convergência das oposições. Com surpresa vi alguns atores virtuais cuja evidente missão é contrabalançar as forças midiáticas a favor do tucanato repetir, à exaustão, notícias de veículos que normalmente repudiam.

Como sempre, a discussão foi radicalizada pelas ideologias sobrando a uns poucos com conhecimento jurídico e alguma moderação fazer esclarecimentos importantíssimos. Ignorados pela grande maioria dos especialistas em generalidades da internet.

Não acho o caso bom para ninguém. O governo, mais uma vez, teve suas entranhas coloridas e não dissecadas pela grande mídia, contudo, o incremento da perda de prestígio da classe política e aí incluo os de todas as posições no nosso cenário político é mais do que evidente.

A oposição de esquerda gritou, o pessoal da rua gritou e no meio a tanta falta de atenção aos escabrosos fatos ligados ao julgamento levantei junto a uma série de amigos uma simples questão:

- Você não acha estranho repetir o discurso da Grande Mídia?

Nada disso importou, o que importava era a limpeza moral da política que, conforme demonstram fatos, inclusive ocorridos mediante a administração paulista dos tucanos, não virá tão cedo. O povo quer exemplos, precisa ver alguém preso para achar que o Brasil mudou, sem saber que pode mudar para pior.

O primeiro ponto foi a enorme discussão sobre o cabimento dos embargos infringentes. No meio da confusão pouquíssimos se deram conta de que aquele recurso, o único que efetivamente examina o mérito, foi responsável por um atraso insignificante se formos observar a data em que o processo começou.

Os palpiteiros acham que há recursos demais, sem fazer a conta entre o tempo gasto com seus prazos e aquele em que o processo purga em poder da Administração Pública.

Esse assunto, no entanto, valeria um outro texto. Prefiro comentar a fórmula mágica utilizada para condenar José Dirceu, aquilo que a mídia vampira comentou muito pouco, mas que na minha opinião merece muito mais atenção do que o cabimento dos embargos infringentes.

A Teoria do Domínio do fato, utilizada para a condenação do líder petista toca em um ponto extremamente delicado, que é justamente a presunção de inocência do Réu. Até mesmo o seu criador, Claus Roxin criticou a forma pela qual ela foi aplicada no caso do Mensalão.

De forma simplista, poderíamos dizer que o erro apontado por ele está no fato de que o que a Teoria Defende é a condenação de quem no momento, devido a uma posição de liderança ou chefia, tinha decisão sobre a prática do crime. O STF, contudo, teria aplicado a teoria baseado na condição de que Dirceu deveria ter ciência do crime, ou seja, presumiu a sua participação.

Os detalhes desse relato podem ser lidos no Pragmatismo Político, até recomendo, eis que o recado direto do especialista teria muito mais acuidade do que qualquer interpretação que eu ofereça ao leitor, o meu destaque, no entanto, se deve ao barulho da Mídia sobre a condenação e o seu silêncio sobre a forma pela qual ela se deu.

Como sempre, nossos oligopólios midiáticos colocam seus interesses de dominação à frente de todos os outros, principalmente dos dos zumbis que a repetem. Na guerra de poder os mais fracos perdem e perdem apoiando quem lhes passa a perna.

Em sua letargia, a massa midiática não entende que a mera presunção de que alguém que chefia uma organização (não falo em quadrilha) sabe e participa de um crime praticado por seus subalternos não atinge somente políticos corruptos, como, aliás, poderia acontecer com os envolvidos no Trensalão paulista, mas também a empresários que, por fatos praticados por seus subalternos, podem acabar no banco dos Réus. 

Até agora, o grito dos conservadores, mesmo dentro de sua lógica deturpada, tinha sentido. Fácil vilipendiar direitos fundamentais de defesa quando não se está incluído no "público alvo" da rapina. Ampla defesa é para corruptos e marginais, homens de bem, que não cometem crimes, não vão precisar nunca se defender.

O problema é que a rapina dos direitos, agora, não se aplica ao "pretinho" da favela. Esse, quando é preso, mesmo que na chefia, não se torna alvo da Teoria, pois seu flagrante está sempre ali, de preferência formando belos mosaicos com os números do batalhão ou da DP que fez a operação. O Mensalão, dessa vez, pode representar um precedente perigosíssimo, mas não para os alvos da punibilidade social e sim para quem delega poder para a prática de atividade econômica.

Em que pese o aceno em prol do combate à corrupção, nada impede o uso da Teoria na atividade empresarial, justamente a menina dos olhos dos nossos direitinhas.

A Mídia nunca fritou seus coxinhas de forma tão maliciosa...

E o Brasil? Bem, o Brasil fica com duas principais hipóteses, igualmente tenebrosas: praticamos um julgamento por exceção ou inauguramos uma prática jurisdicional desastrosa que pode vir não só a desafiar a presunção da inocência, mas sinalizar um precedente perigosíssimo para vários empresários cheirosos, branquinhos e honestos.

Confira a entrevista com Claus Roxin no Pragmatismo Político: aqui

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